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Apoiem o povo afegão no momento mais difícil, clama o secretário-geral da ONU

13 setembro 2021

  • Para apoiar a situação emergencial de 11 milhões de pessoas no Afeganistão, o secretário-geral da ONU lançou um apelo humanitário no valor de 606 milhões de dólares.
  • De acordo com Guterres, os novos governantes do país prometeram cooperação “para garantir que a assistência seja entregue ao povo do Afeganistão”.
  • No entanto, novas violações foram reportadas pelo Conselho de Segurança. Cassetetes e munições foram usados ​​em manifestantes pacíficos na semana passada. Além disso, reuniões não autorizadas foram proibidas e as empresas de telecomunicações foram instruídas a cortar a internet em telefones celulares em áreas específicas de Cabul.
  • Esses desdobramentos acontecem em meio ao aumento da fome. De acordo com dados do WFP, cerca de 93% dos agregados familiares não têm o suficiente para comer, enquanto três em cada quatro famílias já estão reduzindo o tamanho das porções ou pedindo comida emprestada. 
Legenda: Imagem da Missão de Assistência das Nações Unidas no Afeganistão
Foto: © UNAMA

A comunidade internacional deve urgentemente oferecer uma “tábua de salvação” às 11 milhões de pessoas vulneráveis no Afeganistão que enfrentam seu momento mais difícil, disse o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, nesta segunda-feira (13). 

Ao lançar o apelo humanitário no  Conselho de Direitos Humanos em Genebra no valor de 606 milhões de dólares para apoiar a situação emergencial de 11 milhões de pessoas em todo o país, Guterres enfatizou que mesmo antes das incertezas causadas pela tomada do país pelo Talibã no mês passado, o povo do Afeganistão estava em meio a uma das piores crises mundiais. 

“O povo do Afeganistão precisa de uma tábua de salvação”, disse o secretário-geral.  “Depois de décadas de guerra, sofrimento e insegurança, eles enfrentam talvez seu momento mais difícil. Agora é a hora da comunidade internacional apoiar o povo do Afeganistão.” 

O apelo de Guterres foi feito no contexto do aumento da violência no recebimento de protestos pacíficos no país por parte das novas autoridades nas últimas quatro semanas. Na sexta-feira (10), o Escritório de Direitos Humanos da ONU (ACNUDH) advertiu a respeito do escalonamento da repressão no país, acusando o uso de munição real, cassetetes e chicotes.

Enfatizando suas preocupações com o acesso humanitário à medida que as necessidades aumentam dramaticamente, o secretário-geral afirmou que os novos governantes do país prometeram cooperação “para garantir que a assistência seja entregue ao povo do Afeganistão”. No entanto, o chefe da ONU reforçou que para que isso aconteça “nossa equipe e todos os agentes humanitários devem ter permissão para fazer seu trabalho vital em segurança - sem assédio, intimidação ou medo.”  

Um em cada dois afegãos não sabe de onde virá sua próxima refeição, explicou o chefe da ONU, acrescentando que “muitas pessoas podem ficar sem comida no final do mês, quando o inverno se aproxima”. 

Direitos ameaçados - Apelos instantâneos por alimentos, intervenções emergenciais de caráter de vida ou morte e cuidados essenciais de saúde — incluindo cuidados de saúde materna — surgem em um cenário de profunda preocupação em relação aos direitos das mulheres estarem sob ameaça dos novos governantes do Afeganistão. 

No Conselho de Direitos Humanos em Genebra, também nesta segunda-feira (13) a alta-comissária da ONU para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, enfatizou a extensão da crise humanitária e econômica no Afeganistão. Os comentários da comissária vieram após um aviso do Conselho de Direitos Humanos, de que chicotes, cassetetes e munições reais foram usados ​​em manifestantes pacíficos na semana passada. 

A crise avançou para “uma fase nova e perigosa” , afirmou ela, enquanto muitos afegãos também estavam “profundamente preocupados com seus direitos humanos, especialmente as mulheres, as comunidades étnicas e religiosas”. 

Reuniões não autorizadas foram proibidas e as empresas de telecomunicações foram instruídas a cortar a internet em telefones celulares em áreas específicas de Cabul, alertou o Conselho de Segurança na sexta-feira passada (10). 

Aludindo a essas preocupações na conferência de alto nível em Genebra, o secretário-geral da ONU destacou a necessidade de alimentos, intervenções emergenciais de caráter de vida ou morte e cuidados essenciais de saúde. “Mecanismos robustos” foram estabelecidos para coordenar os esforços humanitários ancorados nos direitos humanos, disse Guterres.

Garantias do Talibã  - Reforçando a determinação da ONU de "apoiar" o povo do Afeganistão e proteger "ganhos duramente conquistados" nos últimos 20 anos, o Subsecretário-geral para Assuntos Humanitários e Coordenador de Ajuda de Emergência  da ONU, Martin Griffiths, apontou que recebeu garantias por escrito da liderança do Talibã que permitem a continuação da ajuda humanitária no país. Essas garantias são resultado do encontro do chefe de emergências da ONU com os líderes interinos do Talibã em Cabul na semana passada. Na ocasião, ele pediu aos novos governantes do país que respeitem os direitos humanos e facilitem o acesso à ajuda. 

Mulheres e meninas devem ter acesso à educação, entre outros direitos e serviços "como em qualquer outro lugar do mundo", insistiu o chefe de emergências da ONU, antes de revelar que os compromissos por escrito do Talibã incluíam a remoção de "impedimentos atuais e anteriores" aos projetos humanitários da ONU. 

Agentes humanitários também seriam protegidos, garantiu o Talibã, assim como a integridade das instalações da ONU, explicou Martin Griffiths, acrescentando que, tanto o governo interino quanto a ONU, estavam em acordo sobre os direitos das mulheres e a liberdade de expressão, alinhados aos valores religiosos e culturais do país. 

Atuação do ACNUDH - Diante das denúncias de repressão violenta das manifestações, na última semana (8) a porta-voz do ACNUDH, Ravina Shamdasani, disse que, à medida que mulheres e homens afegãos vão às ruas durante este período de grande incerteza, “é crucial que aqueles que estão no poder ouçam suas vozes”.

“Pedimos ao Talibã que cesse imediatamente o uso da força e a detenção arbitrária daqueles que exercem seu direito de reunião pacífica e dos jornalistas que cobrem os protestos”, acrescentou a porta-voz do ACNUDH. 

Dissidência crescente - De acordo com o ACNUDH, os protestos estão ocorrendo desde 15 de agosto e foram aumentando em número até a instrução da noite de quarta-feira sobre a proibição de assembleias ilegais. 

De 15 a 19 de agosto, as pessoas se reuniram nas províncias de Nangarhar e Kunar para marcar as cerimônias de hasteamento da bandeira nacional. Relatórios confiáveis ​​indicam que, durante esse período, oTalibã teria matado um homem e um menino e ferido outros oito com fogo real, em uma aparente tentativa de dispersar a multidão. 

Em 7 de setembro, durante um protesto em Herat, oTalibã teria atirado e matado dois homens e ferido outros sete. Naquele mesmo dia, em Cabul, outros relatórios confiáveis ​​indicam que oTalibã espancou e prendeu manifestantes, incluindo várias mulheres e até 15 jornalistas.  

Na quarta-feira, enquanto um grupo predominantemente feminino de manifestantes se reunia na área de Dashti-Barchi, em Cabul, pelo menos cinco jornalistas foram presos e dois severamente espancados por várias horas.

O ACNUDH acrescentou que durante uma manifestação organizada por mulheres ativistas e defensores dos direitos humanos na cidade de Faizabad, na província de Badakhshan, o Talibã atirou para o ar e supostamente espancou vários manifestantes. 

Um pequeno grupo de mulheres em Cabul foi violentamente disperso enquanto o Talibã disparava para o alto, acima de suas cabeças. Naquele mesmo dia, mulheres foram violentamente dispersas durante protestos nas províncias de Kapisa e Takhar, e várias ativistas pelos direitos das mulheres em Kapisa foram detidas. 

Direito Internacional - Shamdasani lembrou que os protestos pacíficos são protegidos pelo direito internacional dos direitos humanos, incluindo o artigo 21 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, do qual o Afeganistão é um estado parte. 

Ela disse que “as autoridades devem garantir um ambiente seguro, favorável e não discriminatório para o exercício dos direitos humanos, incluindo a liberdade de expressão e reunião pacífica”. 

Restrições gerais a assembléias pacíficas constituem uma violação do direito internacional, assim como fechamentos gerais de internet, que geralmente violam os princípios de necessidade e proporcionalidade. Isso também significa que os jornalistas envolvidos em reportagens sobre assembleias não devem enfrentar represálias ou outro tipo de assédio, mesmo que uma assembleia seja declarada ilegal ou dispersa. 

A porta-voz lembrou que "há uma obrigação de garantir que qualquer uso de força em resposta a protestos seja um último recurso, estritamente necessário e proporcionado e armas de fogo nunca devem ser usadas, exceto em resposta a uma ameaça iminente de morte ou ferimentos graves". 

Em vez de proibir protestos pacíficos, ela acrescentou, "o Talibã deve cessar o uso da força e garantir a liberdade de reunião e expressão pacíficas, inclusive como meio para que as pessoas expressem suas preocupações e exerçam seu direito de participar dos assuntos públicos".

Fome Crescente no Afeganistão -  O Programa Mundial de Alimentos (WFP) alertou na sexta-feira (10) sobre o aumento da fome em meio a crescentes dificuldades econômicas e incertezas. Cerca de 93% dos agregados familiares não têm o suficiente para comer, enquanto três em cada quatro famílias já estão reduzindo o tamanho das porções ou pedindo comida emprestada.

De acordo com pesquisas por telefone realizadas de 21 de agosto a 5 de setembro em todas as 34 províncias, as famílias também estão comprando alimentos mais baratos e menos nutritivos e os pais estão pulando refeições completas para permitir que as crianças comam. 

O número de famílias que recorrem a estratégias extremas de enfrentamento dobrou: “um sinal claro de que muitas famílias estão à beira da miséria absoluta”, disse a diretora regional adjunta do WFP, Anthea Webb. 

Antes de 15 de agosto e da dominação do Talibã, 81% das famílias já relatavam consumo insuficiente de alimentos e um em cada três afegãos estava em uma situação considerada de insegurança alimentar aguda. 

O WFP descobriu que as famílias agora estão consumindo alimentos ricos em proteínas menos de uma vez por quinzena. Antes do dia 15 de agosto, era uma vez por semana. Com o inverno se aproximando rapidamente e a economia em colapso, Webb disse que agora é "uma corrida contra o tempo para fornecer assistência vital ao povo afegão".

Entidades da ONU envolvidas nesta atividade

ACNUDH
Escritório do Alto Comissariado para os Direitos Humanos
UNAMA
United Nations Assistance Mission in Afghanistan
WFP
Programa Mundial de Alimentos

Objetivos que apoiamos através desta iniciativa