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Madagascar: seca severa pode gerar a primeira fome por mudanças climáticas

25 outubro 2021

O Programa Mundial de Alimentos (WFP) informou que mais de 1 milhão de pessoas no sul de Madagascar estão lutando para conseguir se alimentar. A fome generalizada no país é resultado de uma seca oriunda das mudanças climáticas que rompeu o ciclo saudável das estações no país. 

Devido às atuais circunstâncias, a população no sul do país vive de gafanhotos, frutas e folhas de cactos. Venda de ativos e posses, como campos, gado e casas, e até tirarem seus filhos da escola, se tornaram práticas comum entre as famílias em busca de alívio da crise.

O WFP já atende cerca 700 mil pessoas por mês em Madagascar, oferecendo ajuda alimentar que salva vidas. Uma resposta de longo prazo também está sendo desenvolvida com apoio de parceiros para permitir que as comunidades locais sejam capazes de se preparar, responder e se recuperar melhor dos choques climáticos.

uma criança é atendida pelo Programa Mundial de Alimentos em Madagascar
Legenda: Crianças menores de cinco anos estão entre as mais afetadas pela desnutrição no sul de Madagascar
Foto: © Tsiory Andriantsoarana/WFP

Mais de 1 milhão de pessoas no sul de Madagascar estão lutando para conseguir o suficiente para comer, devido ao que pode se tornar a primeira fome causada pela mudança climática, de acordo com o Programa Mundial de Alimentos (WFP). 

A região foi duramente atingida por sucessivos anos de severa seca, forçando famílias em comunidades rurais a recorrer a medidas desesperadas apenas para sobreviver. 

Madagascar, a quarta maior ilha do mundo, possui um ecossistema único que inclui animais e plantas não encontrados em nenhum outro lugar do planeta. O país vive uma estação seca, geralmente de maio a outubro, e uma estação chuvosa que começa em novembro.  

Vida cotidiana interrompida - No entanto, a mudança climática interrompeu esse ciclo, afetando os pequenos agricultores e seus vizinhos, disse a oficial de comunicações do WFP na capital, Antananarivo, Alice Rahmoun, falando ao UN News, na quinta-feira (21).  

Alice Rahmoun explicou que as primeiras chuvas devem trazer algum alívio e esperança. "Mas um pouco de chuva não é uma estação chuvosa adequada ”, argumentou.  

“Os impactos das mudanças climáticas são realmente cada vez mais fortes. As colheitas falham constantemente, e as pessoas não têm nada para colher e nada para renovar seus estoques de alimentos”, disse a oficial.

Impactos variáveis - Rahmoun esteve recentemente no sul de Madagascar, onde o WFP e seus parceiros estão apoiando centenas de milhares de pessoas por meio de assistência de curto e longo prazo.   

O impacto da seca varia de um lugar para outro. Embora algumas comunidades não tenham tido uma estação chuvosa adequada por três anos, a situação pode ser ainda pior a 100 quilômetros de distância.  

A oficial da agência de alimentos da ONU se lembra de ter visto aldeias rodeadas de campos secos e tomateiros “completamente amarelos, ou mesmo marrons”, por falta de água.   

Sobrevivendo em gafanhotos - A funcionária do WFP explicou que, em algumas áreas, ainda é possível plantar alguma coisa, ainda que não seja fácil. Nestes locais, as pessoas estão tentando cultivar batata-doce. "Mas em algumas outras áreas, absolutamente nada está crescendo agora, então as pessoas estão sobrevivendo apenas comendo gafanhotos, comendo frutas e folhas de cactos”, informou.

A situação é ainda mais grave porque as folhas do cacto costumam ser destinadas ao gado; não é para consumo humano, e mesmo os cactos estão morrendo de seca, de falta de chuva e de água. "Então é muito, muito preocupante”, lamentou Rahmoun.

Famílias mal suportando - A situação das famílias também é profundamente preocupante. Segundo a representante do Programa da ONU, “as pessoas já começaram a desenvolver mecanismos de enfrentamento para sobreviver”.  

Entre esses, ela destacou a venda de gado para conseguir dinheiro para poder comprar comida. Uma estratégia extrema, uma vez que antes esses animais eram usados para subsistência no campo. Ativos valiosos, como campos ou mesmo casas, também são colocados à venda. Algumas famílias até tiraram seus filhos da escola. 

“Também é uma estratégia agora para reunir as forças da família para encontrar atividades geradoras de renda envolvendo crianças, então isso obviamente tem um impacto direto na educação”, relatou Rahmoun.  

Fornecendo ajuda para salvar vidas - O WFP está colaborando com parceiros humanitários e com o governo para fornecer dois tipos de resposta à crise. Cerca de 700 mil pessoas estão recebendo ajuda alimentar que salva vidas, incluindo produtos suplementares para prevenir a desnutrição. 

mães com crianças aguardam atendimento do Programa Mundial de Alimentos em Madagascar
Legenda: Todos os meses, o WFP fornece assistência alimentar a 750 mil pessoas no sul de Madagascar
Foto: © Krystyna Kovalenko/WFP

“O segundo é uma resposta de mais longo prazo para permitir que as comunidades locais sejam capazes de se preparar, responder e se recuperar melhor dos choques climáticos”, destacou a representante do WFP. “Isso inclui projetos de resiliência, como projetos de fornecimento de água. Estamos fazendo canais de irrigação, reflorestamento e até microsseguro para ajudar os pequenos agricultores a se recuperar de uma colheita perdida”. 

Em última análise, o Programa pretende apoiar até um milhão de pessoas entre agora e abril e está buscando quase 70 milhões de dólares para financiar as operações. “Mais parceiros estão sendo envolvidos na causa para encontrar e financiar soluções de mudança climática para que a comunidade se adapte aos impactos da mudança climática no sul de Madagascar”, conta Rahmoun. 

COP-26: Priorizar a adaptação - Em uma semana, os líderes mundiais se reunirão em Glasgow, na Escócia, para a Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas, a COP26, que o secretário-geral, António Guterres , classificou como a última chance de “literalmente virar a maré” e desviar de um planeta doente. 

Rahmoun disse que o WFP quer usar a conferência para mudar o foco da resposta à crise para a gestão de risco. Para a agência, os países devem estar preparados para os choques climáticos e devem agir em conjunto para reduzir os impactos severos sobre as pessoas mais vulneráveis ​​do mundo, o que inclui os moradores do sul de Madagascar. 

“A COP26 também é uma oportunidade para pedirmos aos governos e doadores que priorizem o financiamento de programas de adaptação climática, para ajudar os países a construir um melhor sistema de gestão de risco, e mesmo em Madagascar, porque se nada for feito, a fome aumentará exponencialmente nos próximos anos devido à mudança climática ”, insistiu a representante do WFP, destacando que a situação deve se repetir também em outros países.

 

Entidades da ONU envolvidas nesta atividade

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