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"Subestimamos esse vírus", avaliam autoridades da ONU sobre o combate à COVID-19

28 dezembro 2021

Onde erramos e o que podemos fazer para acertar daqui para frente? Essas foram as duas perguntas que motivaram a UN News, agência de notícia internacional da ONU, a montar uma retrospectiva do ano focada nos principais fatos do combate à pandemia de COVID-19. 

A reportagem mostra que, apesar do desenvolvimento quase milagroso de vacinas em tempo recorde durante 2020, o vírus continuou a se multiplicar e sofrer mutações ao longo deste último ano, mostrando que muita da responsabilidade pela pandemia prolongada está na falta de colaboração global efetiva. 

Enquanto a desigualdade vacinal se estabelecia, a OMS alertou repetidamente que quanto mais tempo a humanidade leva para suprimir a propagação da COVID-19, maior é o risco de surgimento de novas variantes resistentes às vacinas disponíveis. Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da OMS, descreveu o cenário como um "fracasso moral catastrófico", e acrescentou que "o preço desse fracasso será pago com vidas e meios de subsistência nos países mais pobres."

Em uma nota mais positiva, a OMS fomentou a iniciativa COVAX, reconhecida como o esforço global mais rápido e bem sucedido na história para combater uma doença. O mecanismo foi lançado nos meses iniciais da pandemia, e, até abril deste ano, mais de 100 países haviam recebido lotes de vacinas por meio dele. 

No entanto, o problema da falta de equidade ainda está longe de ser resolvido. Em setembro, a OMS anunciou que mais de 5.7 bilhões de doses de vacina haviam sido administradas globalmente, mas somente 2% tinham ido para cidadãos africanos.

Legenda: Um médico se prepara para realizar uma consulta de COVID-19 em Gaza
Foto: © PNUD PAPP

Em novembro deste ano, quando uma nova variante do vírus da COVID-19 foi identificada e nomeada Ômicron, como a letra do alfabeto grego, as Nações Unidas não pouparam fôlego para alertar os países a respeito dos riscos envolvidos, uma vez que a nova forma do vírus estava se espalhando mais rápido do que a variante Delta. A avaliação é de uma matéria da UN News, a agência de notícias internacional da ONU, que reúne os fatos mais relevantes do combate à pandemia durante o último ano para nos ajudar a responder a pergunta: Onde erramos e o que podemos fazer para acertar daqui para frente? 

Apesar do desenvolvimento quase milagroso de vacinas contra a COVID-19 em tempo recorde durante 2020, o vírus continuou a se multiplicar e sofrer mutações ao longo deste último ano, mostrando que muita da responsabilidade pela pandemia prolongada está na falta de colaboração global efetiva. Em 2021, também testemunhamos o surgimento do mecanismo COVAX, apoiado pelas Nações Unidas, criado para auxiliar os países em desenvolvimento na proteção de suas populações contra o vírus. 

O medo que acompanhou a identificação de uma nova variante é compreensível, mas o seu surgimento não deveria ter sido uma surpresa, uma vez que a Organização Mundial da Saúde (OMS) alertou constantemente a respeito da inevitabilidade das mutações, dado o fracasso da comunidade internacional de garantir que todos — e não somente os cidadãos dos países mais ricos — tivessem acesso às vacinas.

Falando com jornalistas em dezembro, o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, alertou que a Ômicron estava se "espalhando a uma taxa inédita a qualquer variante conhecida até então", e acrescentou: "A essa altura já deveríamos saber que subestimamos o vírus por nossa conta e risco."

Legenda: Uma enfermeira monitora o tratamento de quimioterapia em pacientes com câncer em um hospital no Distrito de Burera, em Ruanda
Foto: © Karel Prinsloo/UNICEF

Catástrofe moral

Em janeiro, o secretário-geral da ONU, António Guterres, já lamentava o fenômeno global auto-destrutivo que ficou conhecido como "vacionalismo", que define a falta de vontade de muitos países de olhar além das próprias fronteiras quando o assunto são os imunizantes e sua distribuição.

O chefe da OMS na África, Matshidiso Moeti, condenou o "aúmulo de vacinas". Segundo o especialista, a única coisa que a prática garante é o atraso da recuperação do continente: "É profundamente injusto que a maioria dos africanos vulneráveis sejam forçados a esperar por vacinas enquanto a segurança de grupos não prioritários é garantida nos países ricos."

Paralelamente, a OMS profeticamente alertou que quanto mais tempo a humanidade leva para suprimir a propagação da COVID-19, maior é o risco de surgimento de novas variantes resistentes às vacinas disponíveis. Tedros descreveu o cenário de distribuição desigual como um "fracasso moral catastrófico", e acrescentou que "o preço desse fracasso será pago com vidas e meios de subsistência nos países mais pobres."

Com o passar dos meses, a OMS continuou a disseminar a mensagem. Em julho, quando a identificação da variante Delta fez soar os alarmes e essa se tornou a nova forma dominante da COVID-19, o mundo atingiu o marco sombrio de quatro milhões de mortes atribuídas ao vírus. O número ultrapassou os cinco milhões dentro de apenas quatro meses, e Tedros foi taxativo ao culpar a falta de produção e distribuição equitativa das vacinas.

COVAX: Um feito global histórico

Em uma tentativa de apoiar os mais vulneráveis, a OMS fomentou a iniciativa COVAX, reconhecida como o esforço global mais rápido e bem sucedido na história para combater uma doença. 

Financiada pelos países mais ricos e por donos de instituições privadas, que arrecadaram mais de 2 bilhões de dólares, o mecanismo COVAX foi lançado nos meses iniciais da pandemia para garantir que as populações em países pobres não fossem excluídas quando as primeiras vacinas bem-sucedidas entraram no mercado. 

A distribuição de vacinas para países em desenvolvimento via COVAX começou em março com Gana, Costa do Marfim e Iêmen, um país assolado pela guerra e devastado financeiramente. O momento em que essas nações tiveram acesso aos imunizantes foi descrito por especialistas como um ponto de virada na luta contra a COVID-19. 

Em abril, mais de 100 países haviam recebido lotes de vacinas via COVAX. 

No entanto, o problema da falta de equidade ainda estava longe de ser resolvido: Em 14 de setembro a OMS anunciou que mais de 5.7 bilhões de doses de vacina haviam sido administradas globalmente, mas somente 2% tinham ido para cidadãos africanos. 

Legenda: Uma criança de três anos em casa, em Lyon, França, durante o isolamento devido à pandemia de COVID-19
Foto: © UNICEF/Bruno Amsellem/Divergence

Educação, saúde mental e direitos reprodutivos

Além de afetar diretamente a saúde de milhões de pessoas, a pandemia provocou uma série de efeitos em cascata, que vão desde a interrupção ou impedimento do tratamento de doenças, e passam por acesso à educação e saúde mental. 

O diagnóstico e tratamento de câncer, por exemplo, foi severamente prejudicado em cerca de metade dos países do globo. Mais de um milhão de pessoas com tuberculose foram privadas de tratamentos essenciais, e o aumento das desigualdades impediram que aqueles nos países mais pobres acessassem serviços relacionados à HIV/AIDS. Serviços e programas de saúde reprodutiva também foram suspensos para milhares de mulheres. 

Agências da ONU acreditam que, somente no Sul da Ásia, interrupções severas nos serviços de saúde devido à pandemia de COVID-19 podem ter resultado em adicionais 239 mil mortes infantis e maternas durante o último ano. Enquanto isso, no Iêmen, o aprofundamento do impacto da pandemia levou a uma situação catastrófica na qual uma mulher morre durante o parto a cada duas horas.

Legenda: Secretário-geral António Guterres assiste à inauguração de instalação para chamar a atenção para a necessidade de os governos priorizarem a reabertura de escolas
Foto: © Eskinder Debebe/ Nações Unidas

Crianças também pagam a conta

Em termos de saúde mental, o último ano teve um impacto considerável globalmente, mas a conta chegou mais alta para crianças e jovens. Em março, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) revelou que as crianças agora vivem o "novo normal", uma realidade devastadora e distorcida, em que o desenvolvimento infantil retrocedeu em basicamente todas as etapas importantes.  

Crianças em países em desenvolvimento foram particularmente afetadas, com o crescimento das taxas de pobreza infantil estimadas em cerca de 15%. Isso significa que mais de 140 milhões de crianças nesses países estão em situações de moradia abaixo da linha de pobreza. 

Quanto à educação, os efeitos também foram devastadores. 168 milhões de crianças em idade escolar em todo o mundo perderam quase um ano de aulas desde o começo da pandemia, e mais de uma em cada três não foram capazes de acessar o ensino remoto desde que as escolas foram fechadas. 

Em sua mensagem em 2020, o UNICEF reforçou que o fechamento das escolas precisa ser uma providência de último recurso. A chefe da agência, Henrietta Fore, disse em janeiro que "nenhum esforço pode ser poupado" para manter as crianças na escola. "A habilidade das crianças de ler, escrever e fazer matemática básica foi prejudicada, e as habilidades das quais elas dependem para prosperar na economia do século 21 foram menosprezadas", ela declarou.

Em agosto, período que segue as férias de verão no hemisfério norte, o UNICEF e a OMS emitiram recomendações para um retorno seguro às escolas, que incluíam tornar os funcionários parte dos planos prioritários de vacinação contra a COVID-19, e imunizar todas as crianças com 12 anos ou mais.  

Um desastre multifacetado

Junto ao clamor por equidade vacinal, ao longo do ano de 2021 as Nações Unidas repetidamente tornaram pública a necessidade de desenvolver novas estratégias de resposta às futuras pandemias, tomando como base o fracasso multifacetado da resposta internacional à emergência da COVID-19. 

Ao longo do ano, uma série de reuniões foram convocadas pela OMS. Elas envolviam cientistas e formuladores de políticas públicas. Em maio, foi anunciada a criação de um centro internacional de controle pandêmico em Berlim, focado em garantir uma melhor preparação e transparência na luta contra as prováveis ​​ameaças à saúde global no futuro.

Em julho, o G20, formado pelas maiores economias do mundo, publicou um relatório independente sobre preparo para pandemias que concluiu que a segurança global da saúde está perigosamente subfinanciada. 

O co-presidente do painel, o político de Singapura Tharman Shanmugaratnam, observou que a pandemia de COVID-19 não foi um desastre de só uma nota, e que a falta de financiamento significa que "estamos vulneráveis ao prolongamento dessa crise, cujas ondas repetidas afetaram todos os países, e que também estamos vulneráveis a pandemias futuras". 

No entanto, o ano terminou em uma nota positiva no que se refere à colaboração internacional: em uma sessão especial da Assembleia Mundial da Saúde, convocada pela OMS e realizada em novembro, os países concordaram em desenvolver um novo acordo global para a prevenção pandêmica. Na ocasião, Tedros reconheceu que temos muito trabalho pela frente, mas interpretou o acordo como um "motivo para comemoração e causa de esperança, da qual ainda precisaremos." 

Entidades da ONU envolvidas nesta atividade

ONU
Organização das Nações Unidas
UNICEF
Fundo das Nações Unidas para a Infância
OMS
Organização Mundial da Saúde

Objetivos que apoiamos através desta iniciativa