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Para Guterres, humanidade está “sonâmbula” diante de catástrofe climática

22 março 2022

Na segunda-feira (21), o secretário-geral da ONU, António Guterres, participou de um evento sobre sustentabilidade promovido pela revista The Economist. Na ocasião, ele disse que o Acordo de Paris está “respirando por aparelhos”.

Com o planeta já 1,2 grau mais quente e 30 milhões de pessoas deslocadas por desastres climáticos, a autoridade máxima da ONU disse que a humanidade está como sonâmbula e a guerra na Ucrânia pode representar um revés ainda maior no esforço coletivo de limitar o aquecimento em 1,5 grau.

Na lista de soluções para reverter o quadro, Guterres pediu a revisão dos planos nacionais, compromisso com o fundo de 100 bilhões de dólares para transição energética e eliminação do uso de carvão e combustíveis fósseis.

usinas de combustível fóssil despejam fumaça no ar
Legenda: As usinas de combustível fóssil são um dos maiores emissores de gases de efeito estufa que causam as mudanças climáticas
Foto: © Ella Ivanescu/Unsplash

A meta prevista no Acordo de Paris de limitar o aquecimento global a 1,5 grau Celsius agora está na “unidade de terapia intensiva” e “respirando por aparelhos”, disse nesta segunda-feira (21) o secretário-geral da ONU, António Guterres, durante um fórum sobre sustentabilidade promovido pela revista The Economist.

Falando por videoconferência, Guterres destacou alguns dos progressos alcançados na COP26 em novembro do ano passado, em Glasgow, mas apontou para a contínua “enorme lacuna das emissões” e admitiu que “o principal problema não foi resolvido ou sequer devidamente abordado”.

“Manter a meta de 1,5 viva requer uma redução de 45% nas emissões globais até 2030 e neutralizar as de carbono até meados do século”, disse Guterres, destacando como a invasão da Ucrânia pela Rússia está se tornando um grande revés no esforço coletivo para desacelerar a ação climática.

Outro ponto de preocupação é o fato de que mesmo que os países cumpram as metas assumidas individualmente até o momento, as emissões globais ainda devem crescer 14% até o fim desta década.  Somente no ano passado, as emissões globais de CO2 relacionadas à energia cresceram 6%, atingindo os níveis mais altos da história, enquanto as emissões de carvão também bateram recordes.

Com o planeta já 1,2 grau mais quente e com 30 milhões de pessoas deslocadas de suas casas por desastres climáticos, Guterres disse que a humanidade está sonâmbula diante da catástrofe. “Em nosso mundo globalmente conectado, nenhum país ou corporação pode se isolar deste nível caos.”

Sem culpados - O chefe da ONU disse que para cumprir a meta de limitação do aquecimento é preciso ir até a maior fonte de emissão, o G20, grupo das principais nações industrializadas. Observando que as economias desenvolvidas e emergentes do G20 respondem por 80% de todas as emissões globais, Guterres criticou a alta dependência destes países do carvão, mas ressaltou que “nosso planeta não pode se dar ao luxo de um jogo de culpa pelo clima”.

“Os países desenvolvidos não devem colocar o ônus do aceleramento de sua transição energética sobre as economias emergentes, nem as economias emergentes devem responder dizendo: ‘vocês exportaram para nós atividades industriais pesadas e de intensa emissão de carbono em troca de mercadorias mais baratas’. Não podemos apontar dedos enquanto o planeta queima”, disse o chefe das Nações Unidas.

Desafios - O secretário-geral também citou a batalha contra o que chamou de “um caldeirão de desafios”, como a recuperação “escandalosamente desigual” da COVID-19, inflação recorde e as consequências da guerra da Rússia na Ucrânia, que corre o risco de derrubar os mercados globais de alimentos e energia, “com grandes implicações para a agenda climática global.

À medida que as principais economias adotam a estratégia de “vale tudo” para substituir os combustíveis fósseis russos, Guterres avaliou que adotar medidas emergenciais, ainda que pareçam ser de curto prazo, podem ajudar a criar uma dependência de combustível fóssil de longo prazo e fechar a janela de 1,5 grau.

“Os países podem ficar tão desesperados diante da redução no fornecimento de combustível fóssil a ponto de negligenciarem as políticas de desincentivo ao uso deste recurso”, insistiu o secretário-geral. "Isso é loucura."

Como a dependência de combustíveis fósseis continua a colocar a economia global e a segurança energética à mercê de choques e crises geopolíticas, “o cronograma para reduzir as emissões em 45% é extremamente apertado”, acrescentou.

Soluções - Desde altos custos de capital até desafios técnicos e financiamento inadequado, a ajuda para que economias emergentes façam a transição do carvão para a energia renovável vem encontrando muitos obstáculos.  “Países desenvolvidos, bancos multilaterais de desenvolvimento, instituições financeiras privadas e empresas com know-how técnico – todos precisam unir forças para apoiar em grande escala e com velocidade a transição das economias dependentes de carvão”, pediu Guterres.

Embora seja um “grande desafio”, as economias desenvolvidas e emergentes devem cooperar entre si para que todos os países do G20 consigam reduzir as emissões. Um destes desafios é o desmantelamento de infraestruturas nacionais ligadas à produção do carvão, ainda que todas as nações do G20 já tenham concordado em parar de financiar ao menos a produção de carvão no exterior.

“Mesmo a ação mais ambiciosa não pode apagar o fato de que a situação já é ruim e em alguns lugares irreversível”, lamentou o secretário-geral. “Adaptação e mitigação devem ser buscadas com igual força e urgência, com os investimentos sendo dramaticamente ampliados para acompanhar os impactos acelerados”, disse ele, pedindo a todos os doadores e parceiros técnicos que trabalhem com a ONU e governos vulneráveis para identificar e financiar projetos e programas.

Financiamento - O alto funcionário da ONU também pressionou os países mais ricos e as instituições financeiras internacionais a cumprirem e tornarem uma prioridade o financiamento de 100 bilhões de dólares, em 2022, de um fundo para apoiar a transição dos países em desenvolvimento.

Ele também disse que o financiamento misto deste fundo pode gerar parcerias com instituições do setor privado em prol da inovação, o que resultaria em um desbloqueio de trilhões para a transição energética. “É a coisa certa e lucrativa a fazer”, argumentou.

Guterres encerrou sua participação no evento incentivando os países a trocarem o pé do freio para o do acelerador, rumo à descarbonização da economia global e ao futuro da energia renovável.

Ele concluiu estabelecendo etapas para atingir a meta de 1,5 grau, começando com a aceleração da eliminação do carvão e dos combustíveis fósseis; implementação de uma transição energética justa e sustentável; e fortalecimento dos planos climáticos nacionais.

Também é imperativo ajudar as economias emergentes a eliminar o carvão com urgência; aumentar o financiamento climático para desbloquear os trilhões necessários; descarbonizar os principais setores - como transporte marítimo, aviação, aço e cimento - e proteger os mais vulneráveis, garantindo que a adaptação seja igualitária.

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