Crise global do custo de vida leva 71 milhões à pobreza, alerta PNUD
12 julho 2022
Em apenas três meses, 71 milhões de pessoas no mundo em desenvolvimento tornaram-se pobres, alerta um novo relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).
O impacto nas taxas de pobreza, drasticamente mais rápido do que o choque da pandemia de COVID-19, é consequência direta dos aumentos globais dos preços de alimentos e energia, um dos efeitos em cascata da guerra na Ucrânia.
A análise, feita em 159 países em desenvolvimento, indica que os picos de preços em commodities-chave já estão tendo impactos imediatos e devastadores nas famílias mais pobres, com pontos críticos nos Balcãs, países da região do Mar Cáspio e África Subsaariana.
As crescentes taxas de inflação provocaram um aumento no número de pessoas pobres nos países em desenvolvimento. Foram 71 milhões em apenas três meses, desde março de 2022, alertou o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) em relatório divulgado este mês (julho).
À medida que as taxas de juros se elevam, em resposta à subida da inflação, existe o risco de se desencadear mais pobreza, induzida pela recessão que pode exacerbar ainda mais a crise, acelerando e aprofundando a pobreza em todo o mundo, aponta o informe “Enfrentando a crise do custo de vida nos países em desenvolvimento: projeções de pobreza e vulnerabilidade e respostas políticas” (em tradução livre do inglês).
Os países em desenvolvimento, às voltas com reservas fiscais esgotadas e altos níveis de dívida pública, bem como taxas de juros crescentes nos mercados financeiros globais, enfrentam desafios que não podem ser resolvidos sem atenção urgente da comunidade global.
A análise de 159 países em desenvolvimento indica globalmente que as altas de preço de commodities-chave já estão tendo impactos imediatos e devastadores nas famílias mais pobres, com pontos críticos mais evidentes nos Balcãs, países da região do Mar Cáspio e África Subsaariana (em particular a região do Sahel), segundo as estimativas do PNUD.
O relatório amplia os insights apresentados nos dois resumos do Grupo de Resposta a Crises Globais, do secretário-geral da ONU, sobre os efeitos em cascata da guerra na Ucrânia.
“Aumentos de preço sem precedentes significam que, para muitas pessoas no mundo todo, a comida que elas podiam comprar ontem não é mais acessível hoje”, afirmou o administrador do PNUD, Achim Steiner. “Essa crise de custo de vida está levando milhões de pessoas à pobreza e até a fome, a uma velocidade de tirar o fôlego e, com isso, a ameaça de aumento da agitação social cresce a cada dia”.
Escolhas difíceis - Os formuladores de políticas que respondem à crise do custo de vida, principalmente nas nações mais pobres, enfrentam escolhas difíceis. O desafio é equilibrar um alívio significativo de curto prazo para famílias pobres e vulneráveis em um momento em que a maioria dos países em desenvolvimento está lutando com a redução do espaço fiscal e o aumento da dívida.
“Estamos testemunhando uma divergência crescente e alarmante na economia global, à medida que países em desenvolvimento enfrentam a ameaça de ser deixados para trás enquanto lutam para lidar com a contínua pandemia de COVID-19, níveis escorchantes de dívida e agora uma crise alimentar e energética acelerada”, disse o administrador do PNUD.
“No entanto, novos esforços internacionais podem debilitar este ciclo econômico vicioso, salvando vidas e meios de subsistência – isso inclui adotar medidas decisivas de alívio da dívida; manter as cadeias de abastecimento internacionais abertas; e agir de forma coordenada para garantir que algumas das comunidades mais marginalizadas do mundo possam ter acesso a alimentos e energia a preços razoáveis”.
Os países tentaram atenuar os piores impactos da crise atual recorrendo a restrições comerciais, estímulos fiscais, subsídios gerais à energia e transferências de dinheiro direcionadas. O relatório conclui que as transferências de dinheiro direcionadas são mais equitativas e econômicas do que os subsídios gerais.
Subsídios de energia - “Embora os descontos na conta de luz possam ajudar no curto prazo, no longo prazo eles promovem desigualdade, exacerbam ainda mais a crise climática e não suavizam o golpe imediato do aumento do custo de vida tanto quanto as transferências de dinheiro direcionadas”, afirmou o autor do relatório e chefe de Policy Engagement Estratégico do PNUD, George Gray Molina. “Eles oferecem algum alívio como curativo imediato, mas correm o risco de causar lesões piores ao longo do tempo”.
O relatório mostra que os subsídios de energia beneficiam desproporcionalmente as pessoas mais ricas, com mais da metade dos benefícios de um subsídio de energia universal favorecendo os 20% mais ricos da população. Em contraste, as transferências de dinheiro vão principalmente para os 40% mais pobres da população.
“O dinheiro nas mãos das pessoas que estão sofrendo com os aumentos astronômicos de preço de alimentos e combustíveis terá um impacto generalizado de maneira positiva”, disse Molina. “Nossa modelagem mostra que mesmo transferências de dinheiro muito modestas podem ter efeitos consideráveis e estabilizadores para os mais pobres e vulneráveis nesta crise. E sabemos pelas respostas da COVID-19 que os países em desenvolvimento devem receber apoio da comunidade global para ter espaço fiscal de maneira a financiar esses programas (de transferência de renda)”, completou.
Moratória - Molina acrescentou ainda que, para liberar os recursos necessários, uma moratória da dívida oficial por dois anos deve ser considerada para ajudar todos os países em desenvolvimento – independentemente do PIB per capita – a se recuperarem dos choques. Isso ecoa os apelos recentes das Instituições Financeiras Internacionais por mais liquidez para os países em desenvolvimento.
A pandemia da COVID-19, sozinha, elevou a dívida dos países em desenvolvimento a sua maior alta em 50 anos, o equivalente a mais de duas vezes e meia suas receitas, segundo o Banco Mundial.
Os países que enfrentam os impactos mais drásticos da crise em todas as linhas de pobreza são a Armênia e o Uzbequistão na Ásia Central; Burkina Faso, Gana, Quênia, Ruanda e Sudão na África Subsaariana; Haiti na América Latina; e Paquistão e Sri Lanka no sul da Ásia. Na Etiópia, Mali, Nigéria, Serra Leoa, Tanzânia e Iêmen, os impactos podem ser particularmente fortes nas linhas de pobreza mais baixas, enquanto na Albânia, República do Quirguistão, Moldávia, Mongólia e Tadjiquistão os impactos podem ser mais severos.
Clique aqui para baixar o relatório em inglês.