Fundo de População da ONU ressalta contribuições dos migrantes para países e economia
03 outubro 2018
[caption id="attachment_148450" align="aligncenter" width="680"] Seminário “Migração e seus impactos na Sociedade do Século XXI” aconteceu no auditório do Palácio do Planalto, em Brasília. Foto: UNFPA Brasil/Webert da Cruz[/caption]
Em seminário em Brasília sobre migrações e suas consequências para o desenvolvimento dos países, o Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) criticou a narrativa de que o mundo vive uma crise migratória. Agência lembrou que deslocamentos são parte de toda a história da humanidade e vem acompanhados de crescimento na produtividade das sociedades.
“Considerar o contexto atual como uma crise migratória é um grande erro. Há menos de cem anos, mais de 25% da população europeia saiu da Europa para outros países”, afirmou o representante da instituição no Brasil, Jaime Nadal.
Segundo o dirigente, “a migração equilibra a oferta da população economicamente ativa em escala global”, além de ter um “papel fundamental em termos do crescimento da produtividade”. O fenômeno, acrescentou Nadal, beneficia tanto as sociedades de origem quanto as que têm recebido essa população.
Realizado em setembro (24), o evento “Migração e seus impactos na Sociedade do Século XXI” reuniu especialistas do governo, academia e sociedade civil para discutir os desafios de integração dos estrangeiros. Encontro também debateu as estratégias de diferentes países para lidar com os movimentos migratórios.
“A sociedade brasileira é uma sociedade construída a partir dos migrantes, pelas diferentes ondas migratórias ao longo do tempo. Essa população contribuiu com capacidades, conhecimento e habilidades que não estavam presentes no Brasil, às vezes no comércio, na indústria e na cultura”, disse o secretário de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, Marden Melo, em entrevista.
O território também tem sido destino de estrangeiros em anos mais recentes. Entre 2000 e 2015, mais de 800 mil migrantes internacionais foram registrados no Brasil. Destes, 42,5% são originários dos países da América Latina e do Caribe; 27,4% são europeus; e 16,7% são de origem asiática. Os dados são do Atlas Temático Observatório das Migrações - Migrações Internacionais, elaborado pelo Observatório das Migrações em São Paulo, em parceria com o UNFPA, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e o Conselho Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento (CNPq).
Rosana Baeninger, professora da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e coordenadora do Atlas, ressaltou que o Brasil é um país de trânsito migratório, ou seja, as pessoas migrantes passam pelo país, mas não se fixam definitivamente. Por isso, as políticas públicas para essa população, segundo a especialista, precisam contemplar a mobilidade interna.
Outro fenômeno destacado pela pesquisadora foi a mudança no perfil dos migrantes, que passaram de europeus brancos para um contingente não branco bastante heterogêneo, instalado nos municípios e não mais nas capitais brasileiras. A transformação pode agravar preconceitos étnicos e raciais.
Baeninger também abordou a inserção econômica dos estrangeiros que se estabelecem no Brasil.
“Existe a possibilidade de serem absorvidos pela estrutura natural do mercado, pela construção civil e trabalho doméstico, e outras ocupações de nichos étnicos, como na costura, nos restaurantes e como vendedores ambulantes. Os senegaleses têm uma cultura natural e mundial de vendas de eletrônicos, enquanto as filipinas são treinadas, no próprio país de origem, para a economia do cuidado, exercendo a função de babás, por exemplo”, explica a docente da UNICAMP.
Jorge Martinez Pizarro, mestre em População e Desenvolvimento pelo Centro Latino-Americano de Demografia (CELADE), chamou atenção para as diferenças de gênero nas migrações, pois antigamente era mais comum que as mulheres migrassem acompanhando maridos e família. Agora, as mulheres são empresárias, trabalhadoras, estudantes e executivas e chegam também sozinhas - inclusive ainda na adolescência.
“É um padrão comum o deslocamento de adolescentes, em especial meninas desacompanhadas. Os e as jovens ficam em uma total vulnerabilidade e estão sujeitos à violência, ao trabalho forçado, ao tráfico de pessoas e sexual”, alertou Pizarro.
Exemplos de outros países
Durante o evento, James McNamee, cônsul do Canadá e gerente do Programa de Migração do governo canadense no Brasil, afirmou que seu país enfrenta os mesmos desafios que outras nações. "Mas a diferença é que, desde a nossa origem como país, nós temos planos de migrações, com metas e projetos com objetivos específicos. Hoje em dia, no Canadá, a gente tenta aumentar o número de migrantes no país."
O colombiano William Mejia, consultor internacional sobre migrações, falou sobre o contexto atual na Colômbia. “Em geral, não chegam os imigrantes que o Estado busca, chegam os imigrantes que chegam e podem chegar. Tomo como referência dados do nosso país de 2005: 3 milhões de colombianos moravam fora do país. Mas, nessa época, diferentemente de agora, a migração não era um objeto de interesse na Colômbia”, disse.