76 anos de história da ONU em uma vida
O veterinário Milton Thiago de Mello tem 105 anos. Na véspera do aniversário das Nações Unidas, conheça a história de vida de quem acompanha a vida da ONU.
“O mundo depois da pandemia vai ser diferente – o planeta foi forçado a dar uma freada de arrumação, e disso vai nascer um mundo novo”. A previsão é de Milton Thiago de Mello, e ele fala com propriedade: aos 105 anos de idade, a pandemia de COVID-19 é a segunda que Milton atravessa.
Além de duas pandemias – gripe espanhola e COVID-19 -, Milton assistiu a duas guerras mundiais e incontáveis outros conflitos; morou em muitas cidades e países diferentes e conheceu boa parte do mundo; viu a ciência avançar – e deu sua significativa contribuição para isso; testemunhou o nascimento e, eventualmente, o esgotamento de diversas instituições.
Uma dessas instituições que ele viu nascer e com a qual contribuiu desde o princípio foi a Organização das Nações Unidas. Quando a ONU foi criada, em 1945, Milton estava prestes a completar 30 anos de idade e já tinha uma sólida carreira como veterinário e cientista. Ele é testemunha dos 76 anos da instituição que ajudou a construir.
Milton estudou na Escola de Veterinária do Exército, no Rio de Janeiro, e desde cedo se destacou pela aptidão para a pesquisa e a ciência e por seu compromisso com o bem-estar animal. Trabalhou em diferentes laboratórios do Exército e, na década de 1940, serviu no Instituto Militar de Biologia, onde preparou o soro antitetânico utilizado pelos combatentes brasileiros durante a Segunda Guerra Mundial.
Atuou no Instituto Oswaldo Cruz – hoje Fundação Oswaldo Cruz – por mais de 20 anos e foi professor do Colégio Militar do Rio de Janeiro também por duas décadas. Em 1974, foi trabalhar na área de biologia e primatologia da Universidade de Brasília.
Milton foi pioneiro na pesquisa sobre doenças que afetam animais e seres humanos, numa época em que o conceito de zoonose ainda não estava tão difundido. Sua pesquisa na área de brucelose, doença infecciosa que afeta o gado e a saúde humana, o aproximou da Organização Pan-Americana da Saúde e Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS). Seu primeiro trabalho com a OPAS/OMS foi ainda em 1948, na Argentina.
Quando entrou para a reserva do Exército, começou a trabalhar também com a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). A colaboração com diferentes entidades das Nações Unidas o levou para Guatemala, Estados Unidos, México, Peru, Colômbia, República Dominicana e El Salvador, entre outros. Neste último, conheceu a médica psiquiatra Angela de Mello, sua esposa desde 1963.
Foram muitos anos de colaboração intensa e, apesar do status de aposentado, Milton nunca se desligou totalmente do trabalho como pesquisador e cientista. Os títulos, honrarias e homenagens também foram muitos ao longo da extensa carreira. “Passei de faroleiro a farol”, resume ele.
Com a lucidez e o bom humor intocados pelo passar dos anos, Milton segue acompanhando o desenvolvimento da biologia e veterinária, os rumos do país e do mundo e a atuação das Nações Unidas, com especial atenção para os esforços de paz.
“A ação pacificadora da ONU foi a mais importante contribuição da instituição”, afirma. “Tenho a impressão de que, sem a ONU, o mundo estaria hoje mergulhado em guerras por conquista de mercados”, avalia.
“Acompanhei toda a história das Nações Unidas. Depois da Guerra, faltava um elemento que congregasse os países, e esse elemento foi a ONU, graças inclusive à atuação do Brasil”, relata. “Existe a tendência humana para associar-se, isso é biológico. A ONU faz essa associação no plano macro, universal”, conclui.
Aniversário - A ONU completa 76 anos no próximo dia 24 de outubro. Para marcar a data, a ONU Brasil conta semanalmente a trajetória profissional de pessoas que ajudaram a construir a história da instituição no país.