Mãe e filha protegem erva-mate no Paraná
Liderada por mulheres rurais, a família Vergopolem é uma das guardiãs do tradicional cultivo da erva-mate, produção candidata a Patrimônio Agrícola Mundial.
Todos os dias pela manhã, Verônica Vergopolem se levanta para cuidar do cultivo na propriedade “Serra das Araucárias”, no município de Bituruna, interior do Paraná. A produção de erva-mate é responsável pelo sustento financeiro e a horta pela segurança alimentar da família. De forma agroecológica, a produtora rural providencia o pão e as frutas, a erva do chimarrão e até mesmo o arroz, o feijão e as verduras que enchem a mesa em todas as refeições.
Filha de produtores rurais, ela carrega o orgulho de ser agricultora e entende a importância da preservação da natureza. “Eu posso dizer que sou erveira. A gente planta tudo de forma orgânica, natural, nunca usamos químicos aqui. Eu cuido do meio ambiente”, diz.
O conhecimento de Verônica sobre a biodiversidade e o cultivo da erva-mate, bem como o seu carinho, a sensibilidade e o respeito pela natureza, foram passados também para seus filhos. Jéssica Vergopolem abraçou o cultivo da erva-mate e hoje, mãe e filha saem para fazer a coleta da semente, o plantio de mudas, a colheita das folhas e a poda. “Minha raiz é minha essência, é onde meus pés sempre caminharam, nessa terra e nesse chão. A erva-mate esteve comigo desde pequenininha. É um ensinamento muito bonito que recebi da minha mãe, e quero seguir fazendo, eu vejo como o meu futuro”, conta Jéssica.
A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) reconhece a família Vergopolem como exemplo de mulheres rurais, consideradas as principais responsáveis pela transmissão do conhecimento e da perpetuação da história de seus povos, incluindo conhecimentos técnicos, como manejo agroecológico, seleção de sementes ou uso medicinal de ervas. “O conhecimento tem que ser transmitido, ampliado, não pode ter barreiras. Tem que querer aprender e ensinar, e é isso que nós mulheres precisamos lutar para que aconteça”, diz Jéssica.
Para a FAO, as mulheres são agentes cruciais de mudança na luta contra a pobreza rural, a fome e a desnutrição. Ao compartilhar desta mesma visão e apoiar a melhoria da segurança alimentar e nutricional das mulheres, trabalhando para aumentar a renda e o poder de decisão destes grupos, a agência das Nações Unidas acredita que será possível alcançar uma verdadeira mudança para um desenvolvimento rural inclusivo e sustentável.
Patrimônio - Em dezembro de 2021, a FAO no Brasil realizou uma missão para a avaliação da candidatura da produção tradicional de erva-mate no Paraná como um dos Sistemas Importantes do Patrimônio Agrícola Mundial (SIPAM). A produção no centro-sul e sudeste do Paraná envolve a família Vergopolem, além de outros aproximadamente sete mil agricultores e agriculturas familiares, e alia a produção agrícola à manutenção de tradições, valorização social, saberes e técnicas populares, bem como a preservação do meio ambiente.
A erva-mate é uma espécie nativa da região sul do Brasil usada no preparo de bebidas, como chimarrão, tererê e infusões (“chá mate”). É cultivada em modo agroecológico junto a remanescentes de Floresta com Araucária, e os cultivos agregam conhecimentos e saberes tradicionais e ancestrais. As plantações se consorciam com a vegetação nativa, aproveitando a iluminação e o sombreamento sobre as plantas, bem como os nutrientes providos pela própria floresta.
Ao redor do mundo, a FAO reconhece 62 sistemas agrícolas, em 22 países. Destes, apenas quatro estão na América Latina. O “Sistema Tradicional e Agroecológico de Erva-mate na Floresta com Araucária” é candidato a ser a segunda iniciativa brasileira reconhecida pelo programa SIPAM – a primeira foi o sistema tradicional das comunidades apanhadoras de flores sempre-vivas, da Serra do Espinhaço em Minas Gerais.