Discurso de Amina Mohammed no Ministério das Relações Exteriores do Brasil
Discurso da vice-secretaria-geral das Nações Unidas, Amina J. Mohammed, em evento sobre a Agenda 2030 no Palácio Itamaraty, em Brasília.
Estou grata ao governo do Brasil por acolher esta importante conversa, que não poderia ser mais oportuna.
Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) nasceram no Brasil. Do Rio em 1992 à Rio +20, o Brasil sempre foi uma voz de liderança para um modelo de desenvolvimento que integra as dimensões social, econômica e ambiental.
Um modelo de desenvolvimento que coloca a transformação econômica no centro.
E um novo paradigma que se aplica a todos os países - universalmente - com foco em financiamento, comércio e transferência de tecnologia, indo muito além das anacrônicas abordagens norte-sul.
Os ODS são sobre este espírito de transformação.
Mas hoje, a meio caminho da Agenda 2030, encaramos uma realidade preocupante.
Neste momento, a comunidade global está falhando com as pessoas e com o planeta.
Apenas 12% das 140 metas dos ODS (das quais temos dados) estão no caminho certo.
O progresso em mais de 50% dos objetivos é fraco e insuficiente. Trinta por cento estão estagnados ou regrediram. Isto inclui objetivos fundamentais para aliviar a pobreza, a fome e os devastadores impactos das mudanças climáticas.
E há um ponto cego global de 29 objetivos para os quais não temos dados para avaliar os progressos.
Estas estatísticas não são apenas números numa página.
Elas têm consequências no mundo real, que se fazem sentir em todo o planeta.
Por exemplo, a fome aumentou, fazendo o mundo recuar para os níveis de 2005.
Com as atuais taxas de progresso, apenas 30% de todos os países atingirão o ODS 1 (sobre a pobreza) até 2030.
Cerca de 3,3 bilhões de pessoas vivem em países sobrecarregados por uma dívida esmagadora, obrigando os governos, com recursos orçamentais já escassos, a gastar mais com a dívida do que com educação ou saúde.
Nosso planeta ferve e corremos o risco de perder a luta contra as mudanças climáticas, a poluição e níveis épicos de perda de biodiversidade.
Muitos destes desafios estão sendo enfrentados aqui mesmo, nesta região.
A região foi fortemente afetada pela pandemia da COVID-19 e muitos países ainda lutam para se recuperar.
As mulheres foram as mais atingidas. Elas representam mais de metade da economia informal da América Latina, o que as coloca numa posição precária na medida em que as perspectivas de crescimento regional diminuem.
Em toda a região, inclusive aqui no Brasil, temos visto um aumento da pobreza e da extrema pobreza entre 2020 e 2021.
Somado a este preocupante quadro, temos o aumento da dívida e o baixo crescimento, a emergência climática, os impactos da guerra na Ucrânia e as crises interconectadas dos sistemas alimentares, de energia e de finanças.
Juntos, estes desafios significam uma previsão de que apenas um quarto das metas dos ODS seja atingida em 2030.
O momento para corrigir o rumo é agora.
As ações tomadas pelo Brasil nos dão esperança – internamente e na medida em que o país retoma seu importante papel na família multilateral.
A liderança do Brasil será essencial enquanto aumentamos nossa ambição nos ODS, no clima e na reforma do sistema financeiro internacional.
Como próximo presidente do G-20 e da COP30, o Brasil pode inspirar uma ação global coletiva para a Agenda 2030.
Ações como impulsionar os investimentos dos ODS em transição energética e energias renováveis, ação e justiça climática, biodiversidade e natureza, sistemas alimentares sustentáveis, tecnologia digital, educação de qualidade, empregos decentes e proteção social.
Ação como defender um estímulo aos ODS para proporcionar alívio imediato, reformando os bancos multilaterais de desenvolvimento e as instituições financeiras internacionais, e garantindo que os países em desenvolvimento tenham uma voz forte na mesa de tomada de decisões.
E ação como o aumento da cooperação sul-sul e triangular para alcançar os ODS - que o Brasil tem priorizado nos últimos anos.
A Cúpula dos ODS em setembro será o palco central para o mundo se reunir em torno das decisões necessárias para colocar o mundo de volta no caminho de um futuro justo, inclusivo e sustentável para todos.
O secretário-geral está apelando aos líderes para que compareçam na Assembleia Geral das Nações Unidas e na Cúpula dos ODS, em setembro, prontos a contribuir para um Plano de Salvamento para as Pessoas e o Planeta.
Isto significa chegar com compromissos nacionais concretos e planos de ação para acelerar o progresso em direção aos ODS.
O Brasil será o primeiro país a falar, como tem feito desde a criação da ONU.
O presidente Lula terá a atenção do mundo.
Sua voz pode ajudar a inspirar o mundo e os exemplos do Brasil podem mostrar que é possível alcançar os ODS, se aumentarmos a ambição e convocarmos vontade política para isso.
Incentivamos o Brasil a ser o mais concreto possível sobre o que implementou internamente, os desafios que enfrenta e as experiências que pode compartilhar com outros países.
Sou grata pela oportunidade de ouvir hoje, em primeira mão, algumas dessas percepções.
O Brasil é conhecido em todo o mundo pelo seu futebol – então vocês sabem melhor do que qualquer outro país que os jogos são vencidos no segundo tempo.
Estou convencida de que este também é o caso dos ODS.
Na medida em que entramos neste segundo tempo, vemos o Brasil como um jogador fundamental - "um craque" - para nos ajudar numa vitória para as pessoas e para o planeta.
Espero uma conversa franca e aberta hoje.
Obrigada!
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