Haitiano que atuava como educador ambiental torna-se parte de rede global do ACNUR sobre o clima
“Sinto-me abençoado por estar no Brasil, pelas oportunidades que tive, de conviver com as pessoas que conheci."
Segundo filho de uma família de seis irmãos, a vida de Ermano Prévoir poderia ter tomado muitos caminhos, mas desde cedo ele optou e segue determinado pelo que o levou para as práticas e estudos ambientais.
“Desde o ensino médio eu me interessei em estudar questões climáticas, pois vivenciava em minha rotina um ambiente ecologicamente degradado, quase sem cobertura vegetal, o que ocasionava – e intensificava – uma série de desastres naturais no Haiti.
"Esse cenário trazia implicações ambientais e também sociais, o que aumentava meu interesse em pesquisar soluções e contribuir com novos conhecimentos para a comunidade”, explica Ermando durante o intervalo de seus estudos.
Após se formar no Haiti em 2015 em agronomia, com especialidade em gestão do meio ambiente e recursos naturais, Ermano discutiu algumas de suas ideias com amigos acadêmicos e do bairro onde vivia e criaram uma organização comunitária para conscientizar a população local sobre medidas de mitigação e impacto das mudanças climáticas em suas vidas.
“Plantamos centenas de árvores, realizamos diversas palestras públicas sobre a importância da preservação ambiental e durante meu trabalho em uma fazenda, criei um projeto de educação ambiental para crianças, onde ensinei o amor e a importância do respeito à natureza”, afirmou Ermando, dizendo que esta foi uma das atividades mais marcantes de sua vida.
Diante da instabilidade sociopolítica de seu país, agravada, dentre outros fatores, por desastres ambientais, Ermano se deslocou ao Brasil em 2018 após ter sido selecionado para fazer um mestrado em ciências ambientais, por meio de um programa de estudo das Organizações dos Estados Americanos (OEA).
🎙️ Ouça a entrevista com o Ermano, concedida ao ACNUR Brasil
Sem falar português, sem ter nenhum conhecido no Brasil e tendo que se adaptar culturalmente a uma realidade completamente diferente, Ermano dedicou-se ao estudo do idioma e em três meses já conseguia se comunicar com os colegas da sala, os quais seguiram o apoiaram apoiando durante o processo de aprendizagem.
“Sinto-me abençoado por estar no Brasil, pelas oportunidades que tive, de conviver com as pessoas que conheci. É um país muito acolhedor e que olha para a questão climática com a devida atenção, com uma estrutura de estudos incrível, gerando muitos saberes que dialogam com a sustentabilidade”.
Concluído o mestrado em 2020 pela Universidade Federal do Pará (UFPA) e motivado pela continuidade de suas pesquisas sobre clima e dinâmicas socioambientais, no mesmo ano Ermano foi selecionado para o doutorado em agronomia pela Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA), onde atualmente está concluindo seus estudos.
“Cheguei até onde estou hoje após enfrentar desafios significativos em busca de segurança e oportunidades para a minha família. Essa experiência de deslocamento me trouxe uma perspectiva única sobre as crises climáticas e suas implicações na vida das pessoas que são impactadas por essa transformação que estamos passando”.
Nas salas de aula em que frequentou, os professores aproveitavam os conhecimentos e a experiência de Ermano para trazer aos demais colegas de estudo outros saberes, ampliando assim as discussões durante as aulas. Tais gestos contribuíram para que Ermano se sentisse mais integrado e acolhido junto aos colegas, trazendo sua perspectiva para a realidade brasileira.
No doutorado, Ermano tem se debruçado sobre o tema da fertirrigação como meio para combater a fome de forma sustentável, com gestão responsável dos recursos hídricos na agricultura em face do agravamento das crises climáticas que o mundo tem enfrentado.
“A escolha de meu objeto de pesquisa não é apenas acadêmica. É uma busca pessoal para entender melhor os desafios globais e como, localmente, podemos construir comunidades mais sustentáveis, responsáveis e resilientes aos desafios que já enfrentamos e a outros que ainda estão por vir. Meu papel é de contribuir com soluções que possam melhorar e salvar vidas”, afirmou.
Como desde jovem Ermano já sabia que a educação é um caminho efetivo para transformar positivamente a sociedade, pautada na coletividade e no respeito ao meio ambiente, a tese a ser defendida em breve é um exemplo de que, com oportunidades, pessoas em necessidade de proteção internacional efetivamente contribuem para novos saberes e para o desenvolvimento das localidades que habitam.
“Espero que as pessoas persistam em seus objetivos de vida, que possam superar obstáculos que aparentam ser intransponíveis e possam contribuir para a construção de um mundo mais inclusivo e respeitoso do meio ambiente”.
Como reconhecimento de seus esforços, considerando sua experiência e pelos saberes adquiridos, em 2023 ele foi reconhecido pela Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) como um dos oito membros da rede global do ACNUR sobre o clima.
Junto a outras pessoas refugiadas e deslocadas do Afeganistão, Iêmen, Myanmar, República Democrática do Congo, Ruanda, Sudão do Sul, Ermano busca trazer soluções ambientalmente responsáveis para que as ações e negociações do ACNUR contemplem suas visões e sejam apresentadas em eventos internacionais que discutem o deslocamento forçado de pessoas associado às mudanças climáticas, uma realidade já evidente e de grande interesse do ACNUR.
Saiba mais:
A crise climática global é uma crise humana que contribui para o deslocamento de milhões de pessoas dentro de seus países de origem e para além das fronteiras. Em muitas situações, as pessoas deslocadas no contexto dos impactos das mudanças climáticas e dos desastres naturais terão direito à proteção internacional sob o Direito Internacional, com interface no mandato e ação do ACNUR.
As pessoas já em deslocamento forçado são, com frequência, especialmente afetadas pelos impactos da crise climática. O documento (em inglês) ‘Impactos das alterações climáticas e deslocamento transfronteiriço - direito internacional dos refugiados e mandato do ACNUR' apresenta uma síntese do posicionamento do ACNUR sobre o tema.
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