Religião e cultura não podem justificar discriminação contra pessoas LGBT, diz ONU
17 abril 2013
O Secretário-Geral da ONU, Ban Ki-moon, denunciou esta semana durante um encontro internacional a discriminação contra lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBT), declarando que a cultura, religião e tradição nunca podem ser uma justificativa para negação dos seus direitos básicos.
"Os governos têm o dever legal de proteger a todos", disse Ban em uma mensagem de vídeo para a Conferência Internacional sobre Direitos Humanos, Orientação Sexual e Identidade de Gênero em Oslo, na Noruega. Falando na última segunda-feira (15), o Secretário-Geral expressou sua indignação com a agressão, prisão e assassinato de pessoas LGBT.
"Alguns vão se opor à mudança. Eles podem invocar a cultura, a tradição ou a religião para defender o status quo. Tais argumentos foram usados para tentar justificar a escravidão, o casamento infantil, o estupro no casamento e mutilação genital feminina", afirmou, adicionando: "Eu respeito a tradição, cultura e religião -- mas elas nunca podem justificar a negação dos direitos básicos."
"Minha promessa para as lésbicas, gays, bissexuais e transexuais integrantes da família humana é esta: eu estou com vocês. Eu prometo que, como Secretário-Geral das Nações Unidas, vou denunciar ataques contra vocês e vou continuar pressionando os líderes para o progresso." O Secretário-Geral ressaltou que muitos governos ainda se recusam a reconhecer a injustiça da discriminação e violência homofóbica.
Números no Brasil
De acordo com levantamento de julho de 2012 da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH-PR), de janeiro a dezembro de 2011 foram feitas 6.809 denúncias de violações de direitos humanos contra pessoas LGBT, envolvendo 1.713 vítimas e 2.275 suspeitos.
Os números oficiais foram sistematizados cm base em dados do Disque Direitos Humanos (Disque 100), na Central de Atendimento à Mulher (180), no Disque Saúde e na Ouvidoria do Sistema Único de Saúde (SUS), bem como por meio de e-mails e correspondências diretas encaminhadas ao Conselho Nacional de Combate à Discriminação LGBT e à Coordenação-Geral de Promoção dos Direitos de LGBT. Os estados com maior número de violações foram São Paulo (1.110), Minas Gerais (563), Rio de Janeiro (518), Ceará (476) e Bahia (468).
67,5% das vítimas se identificaram como sendo do sexo masculino; 26,4% do sexo feminino; e 6,1% não informaram sexo. 47,1% tinham entre 15 e 29 anos. O relatório mostrou, também, um padrão de repetição de violência de, em média, 3,97 violações por pessoa agredida.
Outro aspecto levantado foi o número maior de suspeitos em relação ao número de vítimas, o que sugere que as violações são cometidas por mais de um agressor ao mesmo tempo.
Em seu primeiro relatório oficial sobre violência e discriminação contra a população LGBT, a ONU ressaltou a campanha pública "Brasil Sem Homofobia", lançada em 2004 com o intuito de promover a cidadania e os direitos humanos de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais. No entanto, o estudo -- lançado em dezembro de 2011 -- também cita um espancamento de casal de lésbicas seguido por sexo oral forçado em uma delegacia brasileira.
ONU no Brasil apoia ações contra homofobia
Como parte das ações para combater o preconceito no Brasil e das atividades da Consulta Pública Pós-2015, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) organizou em março deste ano, na Casa da ONU, em Brasília, uma audiência com representantes de associações brasileiras de travestis e transexuais.
As prioridades apontadas pelas associações incluem a eliminação de todas as formas de preconceito e discriminação e o acesso à educação e estrutura para permanência de travestis e transexuais nas escolas e no trabalho.
Também em março, o Escritório do Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos (ACNUDH) lançou uma cartilha sobre orientação sexual e identidade de gênero no direito internacional dos direitos humanos. A edição em português foi realizada pelo Escritório do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (UNAIDS) no Brasil.
O livro, de 60 páginas e com o título “Nascidos Livres e Iguais”, foi concebido como uma ferramenta para ajudar os Estados a compreender melhor as suas obrigações e os passos que devem seguir para cumprir os direitos humanos da população LGBT, bem como para os ativistas da sociedade civil que querem que seus governos sejam responsabilizados por violações de direitos humanos internacionais.
No Brasil, um Projeto de Lei de Identidade de Gênero foi apresentado ao Congresso em fevereiro de 2013. "As pessoas devem poder definir sua própria identidade, dizer quem elas são", afirmou a deputada federal Érika Kokay (DF), autora do projeto de lei juntamente com o deputado Jean Wyllys (RJ).