Projeto brasileiro de Marco Civil da Internet é modelo internacional, diz relator da ONU
09 abril 2014
Durante evento promovido pela UNESCO e parceiros no Rio, palestrantes defendem o acesso à informação como um direito básico e o Marco Civil como um instrumento de neutralidade na web.
Nesta terça-feira (8), durante o segundo dia do seminário “Liberdade de expressão e o Poder Judiciário”, organizado pela UNESCO em conjunto com o Supremo Tribunal Federal e o Conselho Nacional de Justiça, o projeto de lei do Marco Civil da Internet foi destacado e elogiado pelos palestrantes do painel, cujo tema era a “Internet e liberdade de expressão: novos desafios”.
“Alegra-me muito dizer que este país estabeleceu uma lei-modelo, que é a lei do Marco Civil”, disse Frank La Rue, relator especial das ONU para a Promoção e Proteção do Direito à Liberdade de Opinião e de Expressão. “Espero que seja aprovada”, completou, se referindo à tramitação no Senado, após ter sido aprovada pela Câmara dos Deputados.
“Se a gente quer uma Internet colaborativa, vamos fazer um projeto de lei colaborativo”, explicou o professor da Fundação Getúlio Vargas, Joaquim Falcão. “Se o Marco Civil for aprovado, será uma legislação exemplar.”
O direito fundamental à informação
Moderado pelo diretor do Centro de Informação das Nações Unidas para o Brasil (UNIC Rio), Giancarlo Summa, o painel teve como foco as vantagens da Internet para a promoção dos direitos humanos e a universalização da informação, bem como os perigos da concentração midiática e do uso indevido da informação digital.
Mencionando duas liberdades importantes na Internet – a de conteúdo e de acesso –, Frank La Rue observou que, em relação ao acesso, enquanto países como Finlândia e Suécia garantem uma conectividade quase universal entre seus cidadãos, regiões menos privilegiadas, como o continente africano, apresentam um cenário oposto, principalmente devido a problemas de infraestrutura.
“A meu ver, o direito de utilizar a Internet deve existir desde as grandes cidades até as aldeias mais pobres, remotas e rurais de qualquer país do mundo”, diz. “Isto não necessariamente implica em um acesso pessoal e individual, mas comunitário. O inaceitável é que qualquer população fique excluída do acesso à informação.”
Ressaltando as diferenças históricas na formação da web nos EUA e no Brasil, o professor Falcão defendeu que os brasileiros estão mais inclinados a uma conectividade democrática e participativa.
“Nos EUA, a Internet nasceu de pesquisas militares e se desenvolveu no departamento de comércio. No Brasil, ela entrou pela comunidade científica, e qual é o pressuposto fundamental de um cientista? É a liberdade de pensar, testar, dialogar, de ouvir opiniões contrárias e de ser refutado.”
Monopólios na web ameaçam diversidade da informação
Na fase final do painel, aberta a perguntas da imprensa, os palestrantes foram lembrados sobre a recente compra do serviço de telefonia digital WhatsApp pelo Facebook – em transação avaliada em 19 bilhões de dólares – e questionados se tal fato representava uma tendência na concentração do capital e dos meios de comunicação.
“Para que a comunicação seja democrática”, disse La Rue, “é necessário que seja aplicado o princípio da diversidade de informação e de ideias, e isso necessariamente implica em combater os monopólios e a grande concentração de serviços.”
“Olhando além do valor da transação”, complementou Luiz Fernando Moncau, pesquisador gestor do Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV, “o Facebook tem demonstrado o interesse principal, talvez, na presença de um aplicativo nos celulares de todas as pessoas – portanto, capaz de monitorar agendas de contato, acessar nossas redes e uma série de outras informações.”
“Parte da solução para este problema”, concluiu, na última fala da sessão, “é o Marco Civil na Internet, pois reforça o princípio da neutralidade de rede e afirma que novos competidores vão entrar neste mercado – algo que, sem a neutralidade, será praticamente impossível.”
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