Desigualdades ameaçam sustentabilidade das economias, alerta UNESCO
13 março 2017
[caption id="attachment_104718" align="aligncenter" width="1024"] Mais de 220 milhões de latino-americanos (38% da população de América Latina e Caribe) estão em situação de vulnerabilidade. Foto: EBC[/caption]
As desigualdades sociais podem comprometer a sustentabilidade das economias, das sociedades e das comunidades, de modo a enfraquecer os esforços para atingir os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) até 2030, alertou a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) em relatório divulgado na sexta-feira (10).
O “Relatório Mundial de Ciências Sociais 2016: o desafio das desigualdades: caminhos para um mundo justo” foi publicado em português no site da UNESCO. Originalmente em inglês, o estudo foi lançado em setembro do ano passado na Real Academia Sueca de Ciências, em Estocolmo.
São destacadas lacunas significativas nos dados relativos a desigualdades em diferentes partes do mundo. Além disso, o documento apoia o progresso em direção a sociedades mais inclusivas, pedindo pesquisas mais consistentes sobre os vínculos entre desigualdades e disparidades econômicas em áreas como gênero, educação e saúde.
O documento apresenta contribuições de mais de 100 especialistas. Foi supervisionado por um comitê científico consultivo formado por acadêmicos de destaque de todas as regiões, incluindo o Prêmio Nobel de Economia Joseph Stiglitz.
Um dos artigos presentes na publicação foi escrito por Marcelo Medeiros, professor do Departamento de Sociologia da Universidade de Brasília e pesquisador sênior do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). No artigo, o pesquisador aborda as desigualdades sociais brasileiras e faz uma crítica ao sistema tributário do país, considerado pouco progressivo — pesando mais sobre os mais pobres — e economicamente ineficiente.
O relatório foi elaborado pelo Conselho Internacional de Ciências Sociais (International Social Science Council – ISSC) em cooperação com o Instituto de Estudos do Desenvolvimento (Institute of Development Studies – IDS, do Reino Unido), e é copublicado pela UNESCO.
“Reduzir a desigualdade é, em primeiro lugar, uma questão de equidade e de justiça social. Também é fundamental para erradicar a pobreza extrema, estimular transformações em direção à sustentabilidade, promover o progresso social, reduzir os conflitos e a violência, e desenvolver uma governança inclusiva”, afirma o documento.
Ao mesmo tempo em que ocorreu um aumento de cinco vezes da quantidade de estudos sobre desigualdades e justiça social em publicações acadêmicas entre 1992 e 2013, muitos deles conferem pouca atenção a desigualdades que vão além da renda e da riqueza, tais como as que são vistas nas áreas de saúde, educação e gênero.
O relatório identifica ainda sete dimensões inter-relacionadas da desigualdade: econômica, política, social, cultural, ambiental, espacial e com base no conhecimento. Intimamente ligadas, elas criam círculos viciosos de desigualdade, os quais são transmitidos de uma geração para outra.
“Este relatório faz um alerta: preencher a lacuna nas pesquisas em ciências sociais sobre as desigualdades é essencial para se alcançar a ambição transversal da Agenda 2030 por transformações para 'não deixar ninguém para trás'”, disse a diretora-geral da UNESCO, Irina Bokova.
O documento também pede por mais cooperação entre disciplinas, fronteiras geográficas e campos de pesquisa, para auxiliar os governos no desenvolvimento de políticas mais efetivas para sociedades mais inclusivas. Redes internacionais, fontes abertas de dados, acesso aberto a publicações e softwares são fundamentais para alcançar esse objetivo.
“Precisamos de mais pesquisas sólidas e de longo prazo, no campo das ciências sociais, sobre as desigualdades que continuam a enfraquecer a nossa capacidade de abordar outras prioridades mundiais. Precisamos verificar uma mudança gradual em direção a uma agenda de pesquisa que seja interdisciplinar, de múltiplas escalas e globalmente inclusiva”, disse Mathieu Denis, diretor-executivo do ISSC.
O relatório destaca ainda que o foco das pesquisas sobre desigualdades na área de ciências sociais tende a ocorrer em países desenvolvidos nos quais existem dados confiáveis, ao passo que os países em desenvolvimento não têm dados igualmente sólidos.
Entre 1992 e 2013, a América do Norte e a Europa Ocidental responderam por mais de 90% das publicações na área de ciências sociais e humanas sobre desigualdades e justiça social (incluindo as pesquisas de economistas, psicólogos e sociólogos). A África Subsaariana e a América Latina contribuíram com 3% e 2%, respectivamente, de acordo com o relatório.
Pesquisas sobre as crescentes desigualdades mostraram que quase a metade da riqueza mundial pertence a 1% da população, e as 62 pessoas mais ricas do mundo detêm a mesma quantidade de riqueza da metade mais pobre da humanidade.
Os 193 Estados-membros das Nações Unidas aprovaram os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) em setembro de 2015, uma ambiciosa iniciativa mundial para acabar com a pobreza, tratar das desigualdades e combater a mudança climática nos próximos 15 anos.
Os ODS, que substituíram os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), visam a melhorar a vida, com o compromisso de países ricos e pobres de alcançar uma série de objetivos inter-relacionados, incluindo a redução da desigualdade.
Leia aqui o relatório completo (em inglês).