ARTIGO: A importância das mulheres rurais no desenvolvimento sustentável do futuro
07 dezembro 2017
[caption id="attachment_133423" align="aligncenter" width="1024"] Agricultoras em Rwamagana, Ruanda. Foto: Banco Mundial/A'Melody Lee[/caption]
Por Alan Bojanic, agrônomo e representante da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) no Brasil
As mulheres rurais são as responsáveis por mais da metade da produção de alimentos do mundo. Elas exercem também um importante papel na preservação da biodiversidade e garantem a soberania e a segurança alimentar ao se dedicar a produzir alimentos saudáveis.
Por outro lado, as mulheres rurais são as que mais vivem em situação de desigualdade social, política e econômica. Apenas 30% são donas formais de suas terras, 10% conseguem ter acesso a créditos e 5%, a assistência técnica.
E os desafios para as produtoras rurais não param por aí.
Em todas as regiões do mundo, as mulheres rurais enfrentam mais restrições do que os homens no acesso a terra, insumos agrícolas, água, sementes, tecnologia, ferramentas, crédito, assistência técnica, culturas rentáveis, mercados de produção e cooperativas rurais.
As mulheres, de forma rotineira, também são vítimas de discriminação nos mercados de trabalho rurais e são as responsáveis pela maior parte do trabalho não remunerado, já que ficam também à frente dos cuidados dentro de suas casas, dos filhos e dos afazeres domésticos. Esses fatores contribuem significativamente para diminuir a capacidade das mulheres de cooperar com a produção agrícola e o desenvolvimento rural.
Mas é possível reverter esse quadro.
Para a FAO, a igualdade de gênero requer condições de igualdade entre homens e mulheres no processo de tomada de decisões; na capacidade de exercer direitos humanos; no acesso a recursos e benefícios de desenvolvimento, bem como a administração e oportunidades no local de trabalho e em todos os outros aspectos relacionados aos meios de subsistência.
Nos últimos anos, a Organização tem adotado medidas que possibilitam a integração das questões de gênero no centro dos programas e de políticas de desenvolvimento. O trabalho da FAO vai além das "questões inerentes à mulher" e foca também em áreas que, até então, eram consideradas neutras em termos de gênero, como a agronomia ou a formulação de políticas econômicas específicas.
Como parte desse processo de entender e estudar as mulheres rurais, a FAO tem constatado que, quando as produtoras conseguem ter acesso igual ao dos homens a recursos produtivos e financeiros, oportunidades de renda, educação e serviços, há um aumento considerável na produção agrícola e uma redução significativa no número de pessoas pobres e com fome.
Diversas políticas públicas voltadas para garantir a autonomia e a igualdade de gênero para as mulheres rurais têm sido adotadas pelos países. Na América Latina, por exemplo, a adoção de programas destinados a documentar as mulheres rurais tornou-se uma boa estratégia para que elas tenham acesso a políticas e direitos.
No Brasil, a FAO é parceira do Estado em um projeto destinado a levar cidadania para as mulheres do campo. Nos últimos anos, milhares delas conseguiram o registro civil por meio dessa iniciativa. Com documento em mãos, além de se afirmarem como cidadãs, também puderam ter melhor acesso a saúde, educação, assistência e segurança social, bem como o direito à propriedade de terras, crédito e outros insumos que lhes garantam mais renda e autonomia econômica.
Manter essas e outras políticas, além de aprofundá-las, são os desafios que surgem no futuro, além da luta contra a fome e a pobreza, um dos principais desafios postos pelos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), aprovados pelos países das Nações Unidas em 2015.
O cumprimento dos ODS se torna a cada dia mais necessário, justamente agora, um período em que a FAO voltou a constatar um aumento no número de pessoas que passam fome no mundo. Os últimos dados apontam que, atualmente, 815 milhões de pessoas estão em estado de insegurança alimentar em todo o mundo, 38 milhões a mais em relação ao ano anterior.
Esse crescimento está relacionado em grande parte à proliferação de conflitos violentos e aos efeitos causados pelas mudanças climáticas. Ambos os casos levam milhares de pessoas a terem que deixar suas terras e migrarem para sobreviver. Um tema que foi amplamente debatido durante as celebrações do Dia Mundial da Alimentação, em outubro deste ano. E nessa parcela de imigrantes, está um número expressivo de mulheres do campo e da cidade.
Por isso, precisamos estar atentos e criar mecanismos para garantir um desenvolvimento rural sustentável, com respeito ao uso dos recursos naturais, a soberania e igualdade de gênero, a migração como uma opção, e tudo isso em sintonia com o lema dos ODS de não deixar ninguém para trás.