Apenas quatro mulheres presidiram a Assembleia Geral em 76 anos
22 setembro 2021
- O maior órgão deliberativo da ONU, a Assembleia Geral (UNGA), ainda precisa alcançar paridade de gênero em seu mais alto escalão. Em seu novo livro “4 de 74”, do inglês “4 out of 74”, a presidente da 73ª Sessão, María Fernanda Espinosa, apresenta a trajetória das únicas quatro mulheres a presidirem sessões da UNGA.
- Presidente da última Assembleia Geral, que deixou o posto na semana passada, Volkan Bozkir apoiou o lançamento do livro escrito pela ex-chanceler do Equador e reforçou a importância da participação feminina na ONU.
- Além do Objetivo do Desenvolvimento Sustentável 5, que trata da igualdade de gênero em todos os setores e é parte da Agenda 2030 criada em 2015, a ONU possui outros marcos emblemáticos de presença feminina e avanços em igualdade de gênero que merecem ser lembrados.
A igualdade de gênero é o quinto Objetivo de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas e compõe a Agenda 2030, que busca melhorar os indicadores socioeconômicos ao redor do globo combatendo a pobreza e a fome, a mudança climática, promovendo educação de qualidade e colocando mais mulheres em posições de liderança pelo mundo, entre outros avanços.
Entretanto, um dos seis órgãos principais das Nações Unidas, a Assembleia Geral, ainda precisa aumentar esforços para alcançar a paridade de gênero dentro da Organização, especialmente na liderança da casa. Esta é a opinião do presidente da 75ª Sessão, que deixou o posto na semana passada, Volkan Bozkir, expressada ao apoiar o lançamento do livro “4 out of 74” ou “4 de 74” em português, escrito pela última presidente da Assembleia Geral e ex-chanceler do Equador, María Fernanda Espinosa.
Ausência de mulheres no alto escalão - Embora a Assembleia Geral tenha sido palco de vários momentos históricos para a igualdade de gênero, muito ainda precisa ser alcançado em relação à representação e participação das mulheres. Apenas quatro mulheres foram eleitas presidentes da UNGA em seus 76 anos, e apenas 22 dos 193 Estados-membros representados atualmente têm uma mulher na condição de chefa de Estado ou de governo. As Nações Unidas nunca tiveram uma secretária-geral mulher.
“A grande mensagem aqui é que quatro mulheres em 76 anos de história na Presidência da Assembleia Geral é um número altamente insuficiente. E temos que fazer muito, muito mais para garantir que mais mulheres estejam no mundo da diplomacia, nos espaços de tomada de decisão e nos lugares de liderança que lhes correspondem", disse a autora do livro.
Inspiração para jovens mulheres - Espinosa dedicou o livro a mulheres jovens que querem ocupar cargos e espaços de poder que merecem. No cargo, María Fernanda Espinosa realizou várias iniciativas para aumentar a participação de mulheres na política e em cargos eletivos. Em 2019, ela convidou a Nova Iorque todas as chefes de Estado e Governo mulheres, o que equivalia na época a 10% dos postos em todo o globo.
O livro “4 de 74” apresenta as quatro mulheres que presidiram a Assembleia Geral até agora: Vijaya Lakshmi Pandit, da Índia, presidente da 8ª Sessão em 1953; Angie Elizabeth Brooks, da Libéria, que liderou a 24ª sessão em 1969; e a terceira presidente feminina da casa foi Sheika Haya Rashed Al Khalifa, do Bahrein, da 61ª sessão, em 2006. María Fernanda Espinosa, do Equador, que presidiu a 73ª Sessão em 2018, foi a primeira mulher latino-americana a ocupar o posto.
As mulheres na história da ONU - A ONU Mulheres preparou um especial com momentos emblemáticos da história da busca pela igualdade de gênero na ONU e na Assembleia Geral.
Desde a fundação das Nações Unidas, em 1945, elas têm lutado por espaço e reconhecimento oficial. Durante a assinatura da Carta das Nações Unidas, apenas oito mulheres estiveram presentes entre os 800 delegados e delegadas. Entre elas, a brasileira Bertha Lutz, que foi uma das que lutaram para inscrever os direitos das mulheres no documento fundador da organização. A Carta da ONU se tornou o primeiro acordo internacional a proclamar a igualdade de direitos entre homens e mulheres como parte dos direitos humanos fundamentais. Seu estatuto consagra a igualdade de gênero: “Nós, os povos (…) reafirmamos a fé (…) na igualdade de direitos entre homens e mulheres”.
Posteriormente, elas fizeram história ao conseguir que a igualdade de gênero passasse a fazer parte do direito internacional dos direitos humanos pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, que foi adotada pela Assembleia Geral em 10 de dezembro de 1948.
Além de ocuparem por quatro vezes a presidência, as mulheres também ocuparam outros postos importantes na Assembleia. Frieda Dalen, da Noruega, foi a primeira mulher a se dirigir à Assembleia Geral, em sua primeira sessão, em 1946. No entanto, apenas 60 anos depois, em 2006, uma africana se dirigiu à Assembleia Geral como chefe de Estado. Ela foi Ellen Johnson Sirleaf e discursou como presidente da Libéria. Agda Rössel, da Suécia, foi a primeira mulher representante permanente na ONU. Ela permaneceu nesta posição até 1964.
Recentemente, em 2018, as Nações Unidas alcançaram, pela primeira vez, a paridade de gênero entre seus líderes seniores durante a 73ª sessão da UNGA. A sessão também foi marcada pela primeira-ministra da Nova Zelândia, Jacinda Ardern, que foi a primeira líder a comparecer no Debate Geral de alto nível com seu filho a reboque.
Em 23 de setembro de 2019, Greta Thunberg dirigiu-se às lideranças mundiais reunidas na Cúpula de Ação Climática da ONU de 2019, realizada na cidade de Nova Iorque, antes do debate geral de alto nível. Pela primeira vez, uma delegação de mulheres estava sentada no Salão da Assembleia Geral da ONU. A delegação da Noruega, incluindo a primeira-ministra Erna Solberg, a ministra das Relações Exteriores Ine Marie Eriksen Søreide e a embaixadora da ONU Mona Juul, com as parlamentares Liv Signe Navarsete, Ingjerd Schou e Linda H. Helleland, fez história em uma arena dominada por homens da diplomacia internacional.
Eventos marcaram a luta pela igualdade de gênero - Os esforços para consolidar as normas sobre os direitos das mulheres também estiveram presentes em outros organismos e ações da ONU. Em 1963, a 18ª Assembleia Geral solicitou a uma Comissão que elaborasse uma Declaração sobre a Eliminação da Discriminação contra as Mulheres, que a Assembleia acabou por aprovar em 1967. Em 1975, a Conferência Mundial do Ano Internacional da Mulher foi inaugurada, na Cidade do México, com as delegadas mulheres superando os homens em cerca de seis para um entre as 110 delegações. O Ano Internacional da Mulher foi aprovado pela Assembleia Geral para chamar a atenção para a igualdade das mulheres com os homens e para suas contribuições para o desenvolvimento e a paz.
Outro documento marco, a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW), foi adotado pela Assembleia Geral em 1979. A CEDAW é frequentemente descrita como uma declaração internacional dos direitos das mulheres. Em seus 30 artigos, a Convenção define explicitamente a discriminação contra as mulheres e estabelece uma agenda de ação nacional para acabar com essa discriminação.
O Fundo Fiduciário das Nações Unidas para o Fim da Violência contra as Mulheres (Fundo Fiduciário da ONU) foi estabelecido pela Resolução da Assembleia Geral 50/166, em 1996, como uma resposta direta à Declaração e Plataforma de Ação de Pequim, que também aconteceu naquele ano e foi lembrada ano passado pela Assembleia Geral, pela ocasião de seu 25o aniversário.
Em julho de 2010, a Assembleia Geral criou a ONU Mulheres, a Entidade das Nações Unidas para a Igualdade de Gênero e o Empoderamento das Mulheres, estabelecida através da unificação dos mandatos e recursos do Fundo Fiduciário e outras três iniciativas para um maior impacto no enfrentamento aos desafios da busca pela igualdade de gênero.
E em 2015, os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) adotados por todos os Estados-membros da ONU, como parte da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, incluiu, em seu ODS 5, "alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas". O Objetivo traça metas específicas de gênero, como a eliminação de todas as formas de violência contra todas as mulheres e meninas e a garantia da participação plena e efetiva das mulheres e a igualdade de oportunidades para a liderança em todos os níveis de tomada de decisão na vida política, econômica e pública.
A Assembleia Geral de 2021 tem como tema, “Construindo resiliência por meio da esperança – recuperar da COVID-19, reconstruir a sustentabilidade, responder às necessidades do planeta, respeitar os direitos das pessoas e revitalizar as Nações Unidas”. Como os impactos das crises nunca são neutros em termos de gênero, e a COVID-19 não é exceção, os Estados-membros devem agir deliberadamente para conter os efeitos desproporcionais da pandemia para as mulheres, enquanto consideram como se recuperar e construir resiliência da COVID-19. Em julho deste ano, um Fórum da ONU Mulheres levantou 40 bilhões de dólares para impulsionar a igualdade de gênero e avanço das políticas públicas em meio aos retrocessos trazidos pela pandemia. A desigualdade de gênero também foi abordada pelo secretário-geral, em seu discurso na abertura do debate de alto nível da UNGA este ano. António Guterres listou a questão como uma entre as "seis grandes divisões" a serem resolvidas pelo mundo.
Confira todos os eventos marcantes destacados no especial da ONU Mulheres.